Carvalho e Silva Advogados

Artigo: Quem Deve Redigir uma Convenção de Condomínio

Redação por pessoas não habilitadas causa conflitos e prejuízos aos condôminos
Kênio de Sousa Pereira
O documento mais importante de um condomínio é a convenção, que muitas vezes limita- se a uma minuta que somente define os limites das áreas privativas e comuns, atendendo assim o incorporador ao disposto no artigo 32 da lei que regula as incorporações, possibilitando dessa forma a negociação das unidades na planta ou em construção. A lei determina que a convenção deve estipular diversas normas de convivência e de uso da edificação . O destino das unidades, os direitos e deveres dos condôminos, as penalidades, os quóruns para aprovação das deliberações, a forma de administração e convocação das assembleias e outros diversos pontos importantes.
Os conflitos dos condomínios são agravados em decorrência do costume do brasileiro de se julgar conhecedor de tudo, ignorando que muitas áreas exigem conhecimento técnico e experiência. Quando uma pessoa necessita se submeter a uma cirurgia de coração, contrata um cardiologista, que se faz acompanhar por outros especialistas. Da mesma forma ao projetar um edifício, diversos profissionais, arquitetos, engenheiros calculista, civil, eletricista, hidráulico, empreiteiros e operários especializados são essenciais para concluir a obra.
Mas quando se trata de elaborar documentos jurídicos, que serão a base para um juiz decidir um processo, é absurda a falta de critério e profissionalismo. Certamente, ninguém contrataria um advogado especializado em direito imobiliário para edificar um prédio, pois o resultado é o mesmo quando um engenheiro redige uma convenção. Via de regra, a convenção é redigida por leigos que ignoram os princípios jurídicos e as complexas normas legais que regulam as relações condominiais, processuais, resultando na constatação que mais de 70% destas encontram- se repletas de erros e omissões que acabam por inviabilizar a administração do condomínio, e produzir ações judiciais. Resultado: desgastes, assembleias tumultuadas, prejuízos com insucesso em ações judiciais, agressões, desvalorização da propriedade e finalmente a mudança de moradores que acabam por vender suas unidades para encontrar paz e sossego.
A convenção elaborada por pessoas não especializadas consiste num instrumento de dúvidas e desacertos ideal para aumentar os conflitos, desvalorizar a propriedade, afetar a saúde e a tranquilidade dos ocupantes e ainda gerar prejuízos com processos judiciais infindáveis.
Esses problemas seriam evitados se as pessoas entendessem que a convenção tem caráter institucional e normativo, devendo ser elaborada de preferencia segundo os critérios científicos que regem a interpretação das leis. A doutrina orienta que na interpretação das leis deve- se seguir os seguintes métodos: GRAMATICAL que consiste na arte de falar e escrever bem em uma língua: LÓGICO que incorpora no texto a coerência de raciocínio, de ideias: SISTEMATICO que direciona uma analise ordenada, metódica e coerente com determinada linha de pensamento e/ou de ação: TELEOLÓGICO que orienta a sua finalidade e os meios que irão possibilitar a administração do condomínio dentro da concepção idealizada pelos seus proprietários. Deve ser considerada ainda a influência do processo HISTORICO- EVOLUTIVO em função do desenrolar de acontecimentos e dos conceitos sociais que evoluíram nos diversos tipos de condomínio de forma que cada condomínio possua elementos que o diferenciam de outro. O chamado critério gramatical não é único, antes de verdadeiro método cientifico é um pressuposto da interpretação, ou melhor, uma tarefa preliminar a ela.
Ocorre que, o leigo redige a convenção baseando- se apenas nos conceitos gramatical, relegando os conceitos científicos que orientam a interpretação jurídica. Diante dessa realidade encontramos com frequência convenções com artigos ilegais, confusos e até mesmo constitucionais, como o que determina que a portaria será fechada às 23 horas e aberta somente às 6 horas, não podendo os moradores ter chave e nem transitar naquele período, ferindo assim o direito de ir e vir. Absurdo maior é quando se estipula quórum unanime para a alteração da convenção, ignorando que a lei consagra o quórum de 2/3 do condomínio. Conseguir unanimidade é difícil ate mesmo entre familiares, é praticamente impossível entre dezenas de pessoa com valores, conceitos e gerações totalmente diferentes. Outras aberrações chegam a ferir o direito de propriedade dos condomínios, possibilitando uso irregular de áreas comuns, possibilitando até usucapião por terceiros, causando prejuízos irreparáveis. Tais falhas são agravadas pela falta de interesse dos condomínios em estudarem a convenção e constatarem que a mesma deve ser rerratificada de forma profissional, para evitar o surgimento de problemas futuros.
Já outros condomínios mais atentos e com melhor conhecimento geral, após vivenciarem ou preverem grandes conflitos decorrentes das falhas da convenção, assumem a aventura de “atualizar e redigir” novos artigos para convenção é da noite para o dia, tornam- se verdadeiros juristas criando outras normas de forma irregular. Depois, após muito desgaste decorrente de um processo judicial, movido por condômino que foi devidamente assessorado por um advogado especializado, o condomínio descobre que a assembleia não é assim tão soberana. O condomínio fica surpreso ao perder a ação judicial, culpa o juiz e procura as mais infundadas justificativas, que logicamente tem vários fundamentos, menos jurídicos. Muitos ignoram que a máxima , o contrato faz lei entre as partes ou que a convenção é uma lei, não é uma verdade absoluta. A convenção apesar de consistir numa suposta lei maior de convivência entre os condôminos tem caráter subsidiário, está sujeita aos princípios constitucionais e as leis ordinárias que até mesmo os advogados não são capazes de saber tudo, razão pela qual a cada dia o direito tem se ramificado cada vez mais possibilitando ao profissional maior margem de acerto na sua especialidade. Tal realidade é constatada em várias áreas de conhecimento humano, até mesmo na recente área da informática onde há dezenas de especialidades nos mais diversos níveis.
As cláusulas da convenção devem, pois, ser interpretadas em seu conjunto e de acordo com sua finalidade, sendo inaceitável o vicio de muitos copiarem um modelo, como se todos os edifícios fossem idênticos e o Brasil só tivesse um padrão de bairro, uma classe social, um só padrão socioeconômico- cultural.
A convenção elaborada por pessoas não especializadas consiste num instrumento de dúvidas e desacertos ideal para aumentar os conflitos inerentes da desconformidade de padrões de educação, que acabam desvalorizando a propriedade, afetando a saúde e a tranquilidade dos ocupantes e ainda gerando prejuízos com processos judiciais.