Casa noturna é condenada a indenizar jovem por estupro coletivo em festa
Vítima de estupro coletivo em uma casa de festas em Santos (SP) quando tinha 17 anos, uma jovem deverá ser indenizada por dano moral pela casa noturna em R$ 180 mil. A sentença é do juiz José Vitor Teixeira de Freitas, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Santos. Inconformados, os quatro sócios do estabelecimento recorreram da decisão.
O juiz conjugou regras do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor para fundamentar a sentença. O primeiro impõe o dever de reparar o dano a quem o causar por ato ilícito, acrescentando que o empregador é responsável pela reparação civil dos atos cometidos pelos empregados no exercício do trabalho ou em razão dele. O CDC, por sua vez, prevê em seu a responsabilidade objetiva do fornecedor do serviço (exigindo apenas nexo entre a conduta do prestador contratado e o dano causado).
De acordo com a decisão, no caso sob exame, a boate não proporcionou a segurança necessária para resguardar a segurança da consumidora.
“O agente de segurança apontado como um dos agressores, contratado pela casa noturna, prestava serviço à mesma na data dos fatos, de acordo com os depoimentos colhidos em audiência. Tal serviço tinha como finalidade garantir a segurança dos clientes, o que não ocorreu em relação à requerente (vítima)”, destacou Freitas.
De acordo com o magistrado, ainda que se argumentasse a existência de dúvida quanto à participação do segurança no abuso sexual coletivo, o fato de a violência ocorrer dentro da casa de festas implica no dever da casa noturna em indenizar a garota. “Os seguranças do estabelecimento devem proteger a integridade de todos, sem exceção”.
Testemunhas depuseram no processo que a vítima estava embriagada e, a pretexto de levá-la à enfermaria, o segurança a conduziu até um banheiro para deficientes físicos. Neste recinto, o acusado e mais dois amigos abusaram da cliente. Laudos médicos confirmaram a violência sexual e outras lesões na jovem.
Posteriormente, as mesmas testemunhas declararam que acharam a adolescente desmaiada no banheiro, com ferimentos e sangramento na face, parcialmente despida e necessitando de atendimento médico. Acionaram, então, uma ambulância para socorrer a menor de idade — que entrou no local sem precisar exibir documento de identidade.
Poder público
A jovem também ajuizou a ação de indenização contra o município de Santos e o estado de São Paulo, sob a alegação de que tais entes públicos falharam em seu dever de fiscalização.
As fazendas públicas municipal e estadual sustentaram que não poderiam ser responsabilizadas por fato ocorrido em estabelecimento privado e ao qual incumbia evitá-lo. Também apontaram a inexistência de vínculo entre o abuso sexual e a atuação do poder público, sendo essa tese acolhida pelo juiz para absolvê-las.
“Não foi demonstrado o nexo causal entre a alegada omissão das correqueridas (fazendas públicas estadual e municipal), consistente na falta de fiscalização, e os danos sofridos pela autora”, decidiu o juiz. Segundo ele, apenas a boate deve responder civilmente pelo delito cometido em seu interior por funcionário contra a consumidora.
Os sócios da casa noturna, por sua vez, contestaram o pedido indenizatório da jovem, argumentando que o episódio ainda é apurado no âmbito penal. Eles ainda pleitearam a condenação da vítima por “litigância da má-fé”, afirmando que o estupro não ficou comprovado, conforme o primeiro laudo do Instituto Médico-Legal (IML).
O juiz, no entanto, observou que a ação cível não está vinculada à decisão do processo criminal. “Em que pese a ação penal em relação ao crime de estupro ainda não haver sido julgado, certo é que a requerente sofreu agressões dentro do estabelecimento, mais precisamente no banheiro adaptado às pessoas com deficiência física.”
Por fim, o magistrado reconheceu que a indenização representa apenas “consolo” para amenizar o “sofrimento íntimo” da jovem. Ele justificou que o seu valor foi arbitrado “mediante estimativa prudencial, que leva em conta a necessidade de, com a quantia, satisfazer a dor da vítima e dissuadir, de igual e novo atentado, o autor da ofensa”.