Para escritórios, pagar bônus a auditores inviabiliza julgamentos do Carf
O Centro de Estudos de Sociedades de Advogados (Cesa) pediu a suspensão de todos as sessões de julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (Carf) até que o Executivo “equacione” a situação de impedimento criada pelo “bônus de eficiência” pago a auditores fiscais. Em ofício enviado ao Carf no dia 11 de janeiro, o Cesa afirma que o pagamento do bônus a conselheiros auditores os colocou em situação de impedimento, já que eles passaram a ter “interesse no resultado do julgamento”.
O bônus foi criado no dia 29 de dezembro de 2016 pela Medida Provisória 765, que estabelece que os auditores fiscais e analistas tributários receberão um adicional aos salários conforme sua produtividade. O dinheiro para pagamento desse adicional sairá de um fundo composto das multas aplicadas a contribuintes durante as autuações fiscais.
Como o Carf é um órgão paritário, composto também de conselheiros que são auditores da Receita, a MP criou neles um conflito de interesse. Mantidas as multas aplicadas pelos fiscais, os conselheiros auditores recebem suas partes do “bônus de eficiência”.
O bônus foi bastante criticado pela comunidade jurídica. Tributaristas ouvidos pela ConJur afirmaram que, com ele, o governo criou um incentivo para que os auditores fiscais multem mais e qualifiquem suas multas com mais frequência, violando o princípio da moralidade administrativa, descrito no artigo 37 da Constituição Federal.
No ofício, o Cesa afirma que “a estrutura atual de cálculo e pagamento do bônus poderá ensejar a conclusão de que os conselheiros representantes da Fazenda Nacional julgarão a validade da exigência de multas cujo valor acabará repercutindo no montante de sua própria remuneração”.
“Tal situação suscita dúvida quanto à caracterização de interesse econômico ou financeiro direito ou indireto, fato que impediria o conselheiro de atuar no julgamento de recursos, nos termos do artigo 42, inciso II, do Regimento Interno do Carf”, diz o ofício.
O Cesa é uma associação que reúne mais de 800 escritórios e promove discussões, pesquisas e ações em prol do mercado da advocacia. No documento enviado ao Carf, a entidade pede a suspensão dos julgamentos para não haver prejuízos a seus resultados, já que os impedimentos dos conselheiros auditores pode ser alegado individualmente, e os julgados podem ser questionados na Justiça, justamente por conta da parcialidade dos julgadores.
“Seria recomendável a suspensão das sessões de julgamento do Carf, a fim de que os órgãos de assessoria jurídica do Poder Executivo fossem consultados e que, uma vez confirmada a hipótese de impedimento suscitada, o problema fosse devidamente equacionado”, diz o Cesa. A sugestão é a criação de uma forma alternativa de pagamento do bônus a auditores que sejam ou tenham sido conselheiros do Carf.
O órgão esteve parado durante mais de um mês entre a virada de 2016 para 2017 por conta de uma greve de auditores fiscais. As sessões de julgamento começaram a ser retomadas nesta semana. Por meio da Assessoria de Imprensa, o Carf informou que não comentará o assunto.
O “bônus de eficiência”, aliás, foi criado em maio e é resultado de uma negociação entre os sindicatos de auditores e o governo — foi incluído em projeto de lei em trâmite na Câmara. Com a medida provisória, o governo federal atropelou a discussão legislativa para instituir logo o bônus, já que não pretende dar aumento salarial aos auditores.
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