Advocacia Imobiliária em Salvador

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LEILÃO DE IMÓVEIS – Intimação Pessoal do Devedor – Obrigatoriedade – Entendimento do STJ

 

 

 

LEILÃO DE IMÓVEIS – Intimação Pessoal do Devedor – Obrigatoriedade – Entendimento do STJ

 

 

 

DECISÃO

 

 

 

Trata-se de recurso especial interposto por EMBRACON ADMINISTRADORA
DE CONSÓRCIO LTDA., com fulcro no art. 105, inciso III, alínea “c”, da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado:

 

 

 

 
“AGRAVO DE INSTRUMENTO ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA AÇÃO ANULATÓRIA DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL C.C. CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO Presença dos requisitos a justificar a concessão da tutela provisória Leilão extrajudicial Intimação pessoal do devedor Necessidade Purgação da mora que pode ser efetivada até a arrematação – Decisão reformada Recurso provido” (fl. 131, e-STJ).

 

 
Os embargos de declaração foram rejeitados (fl. 315, e-STJ).No especial, alega a recorrente divergência jurisprudencial e violação do art. 39, II, da Lei nº 9.514/1997. Defende a “nítida validade do leilão extrajudicial realizado pelo credor fiduciário, porquanto a Lei 9.514/97 não exige a prévia intimação pessoal do
devedor acerca da data de realização dos leilões, bem como, restam inaplicáveis as disposições do Decreto-Lei 70/66 aos contratos garantidos por alienação fiduciária” (fl. 340, e-STJ).

 
Contrarrazões às fls. 347/352 (e-STJ).

 
O recurso foi admitido na origem.

 
É o relatório.

 
DECIDO.

 
A irresignação não merece prosperar.

 
Cinge-se a controvérsia a perquirir se imprescindível a intimação pessoal do devedor acerca do local, dia e hora da realização do leilão extrajudicial, realizado sob o rito da Lei nº 9.514/97, sob pena de invalidade da arrematação.
Com efeito, segundo o disposto no artigo 26, caput, da Lei nº 9.514/97, “Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário”.

 

 
Regulamenta o referido artigo de lei, em seus parágrafos, a intimação pessoal para fins de purgação da mora, consoante se observa:

 

 
“Art. 26. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

 

 
§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos conratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação.

 

 
§ 2º O contrato definirá o prazo de carência após o qual será expedida a intimação.

 

 
§ 3º A intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento.

 

 
§ 4º Quando o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído se encontrar em outro local, incerto e não sabido, o oficial certificará o fato, cabendo, então, ao oficial do competente Registro de Imóveis promover a intimação por edital, publicado por três dias, pelo menos, em um dos jornais de maior circulação local ou noutro de comarca de fácil acesso, se no local não houver imprensa diária.

 

 
§ 5º Purgada a mora no Registro de Imóveis, convalescerá o contrato de alienação fiduciária.

 

 
§ 6º O oficial do Registro de Imóveis, nos três dias seguintes à purgação da mora, entregará ao fiduciário as importâncias recebidas, deduzidas as despesas de cobrança e de intimação.

 

 
§ 7º Decorrido o prazo de que trata o § 1º sem a purgação da mora, o oficial do competente Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por este, do imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio.

 

 
§ 8º O fiduciante pode, com a anuência do fiduciário, dar seu direito eventual ao imóvel em pagamento da dívida, dispensados os procedimentos previstos no art. 27”.

 

 
De fato, não há no dispositivo legal acima transcrito, nem no subsequente – que trata do leilão propriamente dito – nenhuma referência expressa à necessidade de intimação pessoal do devedor acerca de local, dia e hora da realização do leilão extrajudicial.

 

 
Ocorre que, em análise mais detida da legislação em comento, nota-se que o artigo 39 da Lei nº 9.514/97 dispõe, sem margem de dúvidas, que, às operações de financiamento imobiliário em geral a que se refere esta lei, aplicam-se as disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66.
Confira-se:

 

 
“Art. 39. Às operações de financiamento imobiliário em geral a que
se refere esta Lei:

 

 
I – não se aplicam as disposições da Lei nº 4.380, de 21 de agosto
de 1964, e as demais disposições legais referentes ao Sistema

 

 
Financeiro da Habitação – SFH;

 
II – aplicam-se as disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-lei nº
70, de 21 de novembro de 1966”.

 

 
Os artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66, por sua vez, preveem o procedimento de leilão extrajudicial de imóvel submetido à execução hipotecária de que trata o decreto.

 

 
Em tal âmbito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito se encontra consolidada no sentido da necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial.

 

 
Nesse sentido, apenas a título exemplificativo, porquanto no âmbito do Decreto-Lei a jurisprudência é caudalosa:

 
“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS A ARREMATAÇÃO DEFEITO DA INTIMAÇÃO DO
EXECUTADO, NA FASE DE PRACEAMENTO DOS BENS. NULIDADE DA ARREMATAÇÃO.

 

 
A arrematação na execução, constitui o ato mais importante do processo, eis que, e através dela que o devedor decai da propriedade de seu imóvel, mediante a alienação forçada. E como ato da maior valia (o da praça), o devedor deve ser intimado pessoalmente para ciência inequívoca do dia e hora de sua realização.

 

 
No conceito de intimação pessoal deve-se entender que o devedor, para a intimação, há de ser procurado no local onde efetivamente reside e não em qualquer outro, para que se não configure uma ciência por intermediação de pessoa.

 

 
Recurso provido. Decisão unanime”.

 
(REsp 36.383/SP, Rel. Ministro DEMÓCRITO REINALDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/09/1993, DJ 25/10/1993)
“PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO HIPOTECARIA EXTRAJUDICIAL – LEILÃO – NECESSIDADE DA INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR – DECRETO-LEI 70/66 –
LEI 8004/90.

 

 
1. A execução extrajudicial, excepcionalmente via para a tutela do credor hipotecário, não coloca o exequente da alcatifa de ente privilegiado diante dos princípios gerais da lei processual, devendo homenagem ao devido processo legal, que alberga a ação extrajudicial, a eficácia da execução está submissa a garantias
procedimentais, entre elas o ato essencial do mutuário executado ser pessoalmente intimado, oportunizando a purgação da mora, antes dos editais de leilão.

 

 
2. Demonstrado o descumprimento de ato essencial quanto a comunicação procedimental aprisionada ao leilão, impõe-se a anulação da arrematação concretizada ao arrepio da lei, ofendendo interesses sociais e individuais.

 

 
3. Precedentes da jurisprudência.

 

 
4. Recurso improvido”.

 

 

(REsp 37.792/RJ, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, PRIMEIRA TURMA,julgado em 22/03/1995, DJ 24/04/1995)
“PROCESSO CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. EXECUÇÃO
EXTRAJUDICIAL. DECRETO-LEI 70/66. LEILÃO. DEVEDOR. INTIMAÇÃO
PESSOAL. NECESSIDADE.

 

 
1. Esta Corte tem entendimento assente no sentido da necessidade de notificação pessoal do devedor do dia, hora e local da realização do leilão de imóvel objeto de contrato de financiamento, vinculado ao SFH, em processo de execução extrajudicial sob o regime do Decreto-lei nº 70/66. Precedentes

 

 

2. Recurso conhecido e provido”.
(REsp 697.093/RN, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA,
julgado em 17/05/2005, DJ 06/06/2005)
“PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. LEILÃO. INTIMAÇÃO PESSOAL
DO DEVEDOR. NECESSIDADE.
Na execução extrajudicial do Decreto-lei 70/66, o devedor deve ser pessoalmente intimado do dia, hora e local de realização do leilão do imóvel objeto do financiamento inadimplido, sob pena de nulidade”.
(AgRg no REsp 719.998/RN, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS,
TERCEIRA TURMA, julgado em 1º/03/2007, DJ 19/03/2007)
“AGRAVO REGIMENTAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – AGRAVO DE INSTRUMENTO
– LEILÃO – SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO – DECRETO- LEI N. 70/66 –
NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR – NECESSIDADE – DECISÃO AGRAVADA
MANTIDA.

 

 
I – Nos termos da jurisprudência desta Corte, a notificação para o leilão, na execução extrajudicial de que trata o Decreto-Lei 70/66, deve ser, necessariamente pessoal. Precedentes.

 

 
II – O Agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão alvitrada, a qual se mantém por seus próprios fundamentos.

 

 
III. Agravo Regimental improvido”.
(AgRg nos EDcl no Ag 1.237.629/ES, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/08/2010, DJe 16/08/2010)

 

 
Analisando o inteiro teor dos precedentes mais antigos desta Corte sobre o tema, nota-se que essa exigência – de intimação pessoal para a realização do leilão extrajudicial – partiu de interpretação do parágrafo único do artigo 36 do Decreto-Lei nº 70/66, que ostenta a seguinte redação:

 

 
“Art 36. Os públicos leilões regulados pelo artigo 32 serão anunciados e realizados, no que êste decreto-lei não prever, de acôrdo com o que estabelecer o contrato de hipoteca, ou, quando se tratar do Sistema Financeiro da Habitação, o que o Conselho de Administração do Banco Nacional da Habitação estabelecer.

 

 
Parágrafo único. Considera-se não escrita a cláusula contratual que sob qualquer pretexto preveja condições que subtraiam ao devedor o conhecimento dos públicos leilões de imóvel hipotecado, ou que autorizem sua promoção e realização sem publicidade pelo menos igual à usualmente adotada pelos leiloeiros públicos em sua atividade corrente” (grifou-se).

 

 
Logo, vê-se que também o Decreto-Lei nº 70/66 não é incisivo quanto à necessidade de intimação pessoal do leilão extrajudicial e, apesar disso, ainda que a lei não seja clara a respeito, a formalidade da intimação pessoal do devedor para o leilão extrajudicial foi amplamente acolhida pela jurisprudência.

 

 
Sendo assim, havendo previsão legal de aplicação do artigo 36, parágrafo único, do Decreto-Lei nº 70/66 ao procedimento previsto na Lei nº 9.514/97 e sendo pacífica, no âmbito daquele decreto, a jurisprudência no sentido da necessidade de intimação pessoal da data do leilão extrajudicial, conclui-se pela incidência desse
entendimento aos contratos regidos pela Lei nº 9.514/97.

 

 
Não bastasse a remissão expressa feita pela Lei nº 9.514/97, em seu artigo 39, inciso II, à incidência dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66, que engloba o artigo 36, parágrafo único, no que interessa, justifica-se a adoção do mesmo entendimento para o procedimento de leilão extrajudicial previsto na Lei nº 9.514/97 por mais dois fundamentos.

 

 
Em primeiro lugar, a assinatura do auto de arrematação representa o último momento para purgação da mora, daí a relevância do conhecimento pelo devedor do momento da alienação do bem.
A propósito:
“HABITACIONAL. SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. PURGAÇÃO DA MORA. DATA LIMITE. ASSINATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. DISPOSITIVOS LEGAIS ANALISADOS: ARTS. 26, § 1º, E 39, II, DA LEI Nº 9.514/97; 34 DO DL Nº 70/66; E 620 DO CPC.

 

 
1. Ação ajuizada em 01.06.2011. Recurso especial concluso ao gabinete da Relatora em 07.02.2014.

 

 
2. Recurso especial em que se discute até que momento o mutuário pode efetuar a purgação da mora nos financiamentos vinculados ao Sistema Financeiro Imobiliário.

 

 
3. Constitui regra basilar de hermenêutica jurídica que, onde o legislador não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo, sobretudo quando resultar em exegese que limita o exercício de direitos, se postando contrariamente ao espírito da própria norma interpretada.

 

 
4. Havendo previsão legal de aplicação do art. 34 do DL nº 70/99 à Lei nº 9.514/97 e não dispondo esta sobre a data limite para purgação da mora do mutuário, conclui-se pela incidência irrestrita daquele dispositivo legal aos contratos celebrados com base na Lei nº 9.514/97, admitindo-se a purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação.

 

 
5. Como a Lei nº 9.514/97 promove o financiamento imobiliário, ou seja, objetiva a consecução do direito social e constitucional à moradia, a interpretação que melhor reflete o espírito da norma é aquela que, sem impor prejuízo à satisfação do crédito do agente financeiro, maximiza as chances de o imóvel permanecer com o
mutuário, em respeito, inclusive, ao princípio da menor onerosidade contido no art. 620 do CPC, que assegura seja a execução realizada pelo modo menos gravoso ao devedor.

 

 
6. Considerando que a purgação pressupõe o pagamento integral do débito, inclusive dos encargos legais e contratuais, nos termos do art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/97, sua concretização antes da assinatura do auto de arrematação não induz nenhum prejuízo ao credor. Em contrapartida, assegura ao mutuário, enquanto não
perfectibilizada a arrematação, o direito de recuperar o imóvel financiado, cumprindo, assim, com os desígnios e anseios não apenas da Lei nº 9.514/97, mas do nosso ordenamento jurídico como um todo, em especial da Constituição Federal.

 

 
7. Recurso especial provido”.
(REsp 1.433.031/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 03/06/2014, DJe 18/06/2014 – grifou-se)
Além disso, manifesta-se como garantia de acompanhamento pelo devedor do procedimento de alienação do bem quanto à sua lisura.

 

 

 

 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.
Publique-se.
Intimem-se.
Brasília (DF), 1º de fevereiro de 2018.
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

 

 

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