Quem é delatado tem direito de acessar delação premiada, decide Gilmar Mendes
A Súmula Vinculante 14, que garante ao investigado acesso às provas do inquérito, também permite que delatados tenham acesso aos depoimentos de uma delação premiada. Por isso, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, garantiu ao deputado estadual Fernando Capez (PSDB), presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, acesso aos depoimentos de um delator de investigação que corre no estado. A decisão, monocrática, é da segunda-feira (23/5).
De acordo com o ministro, embora o artigo 7º da Lei das Organizações Criminosas garanta o sigilo das delações, o parágrafo 2º permite que os citados tenham acesso. Gilmar afirma existirem dois critérios para conceder o acesso: quem pede acesso deve ser acusado de crime na delação; e “o ato de colaboração não deve ser referente a diligência em andamento”.
“O sigilo dos atos de colaboração não é oponível ao delatado”, explica o ministro, citando o parágrafo 2º do artigo 7º da lei. “Trata-se de disposição convergente com a interpretação do STF sobre o acesso da defesa às investigações em andamento, que inclusive adota termos semelhantes aos da Súmula Vinculante 14.”
Capez é representado pelo advogado Alberto Zacharias Toron. O deputado é um dos investigados na chamada operação alba branca, da Polícia Civil de São Paulo. A investigação apura denúncias de que funcionários públicos do estado montaram um esquema com a Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf) para fraudar licitações de merenda escolar. O caso ficou conhecido como “máfia da merenda”.
O presidente da Alesp pede acesso aos depoimentos dados por Marcel Ferreira Julio à operação em regime de delação premiada. A defesa de Capez afirma só ter tomado conhecimento do acordo por meio de reportagem daFolha de S.Paulo publicada no dia 8 de abril.
No texto, o jornal informa que Julio estivera foragido, mas havia se entregado para assinar um acordo de delação premiada. Toron foi pedir acesso à delação ao Tribunal de Justiça de São Paulo, onde deputados estaduais têm prerrogativa de foro, mas teve o pedido negado.
Segundo o relator, desembargador Sérgio Rui, embora a Súmula Vinculante 14 dê aos investigados acesso às provas, “tal direito não se estende aos termos de acordo e de declarações, que compõem a colaboração premiada do investigado Marcel Ferreira Julio, os quais se encontram sob sigilo legal”.
Na Reclamação, Gilmar Mendes corrige o desembargador: “Esses argumentos servem para assegurar o sigilo dos atos de colaboração em relação a terceiros, mas não se aplicam ao delatado”. “Muito embora a fundamentação não seja de todo clara, é possível afirmar que os requisitos para o acesso do delatado estão presentes.”
Ele argumenta que, de fato, é difícil para o juiz saber se há ou não diligências em curso, o que impediria o acesso à delação. Mas afirma que “é essencial” que o magistrado responsável pelo processo requisite informações aos investigadores sobre essas diligências. “Só de posse das informações acerca dos atos de investigação em andamento, o magistrado poderá afirmar a necessidade de preservar o sigilo de ato de colaboração.”
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Reclamação 24.116