Constituição de 1988 revolucionou o direito de greve no Brasil
Com a Constituição Federal de 1988, que teve motivação na parte trabalhista-sindical nas greves dos metalúrgicos do ABC paulista da década de 1970, um novo modelo de relações de trabalho foi implementado no Brasil, estabelecendo-se (artigo 8º, inciso I) que “a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical”.
Pelo artigo 9º da Constituição Federal, a greve passou a ser admitida de forma ampla, como direito dos trabalhadores em geral, a qual é proibida apenas em relação aos militares. Passou-se a admiti-la também no serviço público, mediante lei, e nos serviços e atividades essenciais, com restrições consistentes no atendimento das necessidades inadiáveis da população.
Com efeito, estabelece o artigo 9º da Constituição Federal que “é assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”. No parágrafo 1º deste artigo constou que “A Lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade” e no parágrafo 2º que “Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei”.
O artigo 37 da Lei Maior garante ao servidor público o direito à livre associação sindical (inciso, VI) e o direito de greve, o qual será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica (inciso VII). Somente para o militar, e de forma explícita, o artigo 142 da Constituição (inciso IV) proibiu a sindicalização e o direito de greve.
Enquanto o sistema jurídico brasileiro anterior a 1988 discriminou a greve e a considerou como delito e recurso antissocial, nocivo ao trabalho e ao capital e incompatível com os superiores interesses da produção nacional (artigo 139 da CF de 1937), a Constituição de 1988 representou verdadeira revolução com relação ao direito de manifestação operária, considerando a greve como direito fundamental dos trabalhadores, eliminando a discussão sobre a sua natureza jurídica, se um fato social, uma liberdade ou direito, porque hoje a greve é um direito incluído na categoria dos direitos fundamentais.
Cabe frisar que o Brasil viveu até 1988 um regime de antiliberdade sindical, a qual somente veio, embora relativamente, com a Constituição (artigo 8º e incisos), que, como passo importante, vedou a intervenção e interferência do Estado na organização sindical e concedeu aos trabalhadores, como decorrência lógica, o direito de greve (artigo 9º). Esta, que até então era praticamente proibida (de acordo com a Lei 4.330/1964), além de ser considerada como prática antissocial e como delito, passou a ser considerada como um direito fundamental do cidadão trabalhador.
Por isso, consagra José Afonso da Silva que “a greve não é um simples direito fundamental dos trabalhadores, mas um direito fundamental de natureza instrumental e desse modo se insere no conceito de garantia constitucional, porque funciona como meio posto pela Constituição à disposição dos trabalhadores, não como bem aferível em si, mas como um recurso de última instância para a concretização de seus direitos e interesses”[1].
Desse modo, gostemos ou não, hoje, no Brasil, a greve não é mais um delito, mas, um direito fundamental de manifestação dos trabalhadores, embora, na prática, não seja assim considerada pela maioria dos operadores do Direito e, em especial, pelo capital, porque, convenhamos, a ele não interessa um instrumento que lhe acarreta prejuízo. A greve, não esqueçamos, para cumprir o seu objetivo, tem que causar prejuízo, pois, ao contrário, seria como um sino sem badalo, que pode tocar à vontade, mas ninguém vai ouvi-lo!
[1] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, p. 269. 5ª ed. São Paulo: RT, 1989.